O dia de ontem me lembrou: 10 anos. Pode ser um tempo longo pra pessoas ou coisas que desejamos esquecer. Ou um tempo longo para pessoas e coisas que gostaríamos de ter por perto. Ou um tempo mais longo ainda de quem ou daquilo que a gente tem saudades. Esta data marca os 10 anos de 3 saudades gigantes pra mim.
A primeira, da prima querida que se foi de forma abrupta,
inesperada e sem sentido. Nesses 10 anos, me perguntei mil vezes o sentido
dessa ausência e jamais encontrei uma resposta que seja. A vida pela frente, a
pouca idade, a chegada do filho. Tudo junto, ao mesmo tempo, o buraco que ficou
na família, em cada um de nós, em mim. Foi meu primeiro contato com a ausência
de sentido da morte. Ela vem e não existe uma explicação. E cada um tem que se
haver com isso.
A segunda, será ano que vem. 2014, o ano que fui do céu ao
inferno num espaço de 7 meses. Engravidei após anos de um tratamento sofrido,
passei meses em repouso, tive um mês de paz e meu bebê se foi. Um poço sem
fundo, um ano do qual não me lembro nem como terminou, nem como cheguei até
2015. Me lembro de flashes, da dor, da escuridão, de chorar sem parar. A
saudade do que não foi, daquele que veio e não ficou, de sonhos interrompidos e
abandonados. A saudade de quem eu era até ali.
A terceira será em 2015. Após os 2 anos da partida da prima,
às vésperas do 1 ano da partida do filho, meu melhor amigo, meu irmão, se foi.
Jovem, a vida pela frente, um acidente estúpido de avião. Eu não sabia se
chorava pela falta dele, pelo susto, pelo 1 ano do filho morto, por mim. Desse
dia me lembro com uma clareza absurda. A falta que ele me faz é imensa e diária.
Eu chamo esses 3 anos da minha vida de “o período dos
tsunamis”. Minha sensação era semelhante à quando entramos no mar e somos
derrubados por uma onda imensa, arrastados até a areia e, quando conseguimos
tirar a cabeça da água, vem a próxima onda e nos puxa pro fundo. Você já está
engolindo água, fica de pé e vem a próxima. Se não vier alguém te ajudar, você
vai se afogar ali. Por sorte, eu tive muitas mãos estendidas pra me resgatar.
Sou infinitamente grata aos gestos grandes e pequenos que vieram em momentos
duros, aos silêncios cúmplices, aos ombros que chorei, às pessoas práticas que
resolveram banalidades quando eu não dava conta de pentear meus cabelos. À
algumas pessoas eu agradeci pessoalmente, outras nem sabem o quanto foram
importantes e não tive a oportunidade de dizer.
Esse é daqueles textos que talvez eu não mostre nunca pra
ninguém, porque não gosto de focar na tristeza. Aliás, quando sentei aqui pra
escrever, eu queria dizer de como a saudade se transforma o longo de 10 anos.
Como ela ganha tons mais amenos, como os momentos vividos juntos e a risada das
pessoas queridas passam a morar na gente. Como me divirto imaginando as frases
debochadas do meu amigo em determinadas situações e quase enxergo ele ali e
isso aquece meu coração. Talvez eu tenha sido tomada pela sensação de
fechamento de ciclo que 10 anos evoca e precisei falar da tristeza, que quase
não dividi com ninguém. Uma das coisas mais difíceis num processo de luto é
encontrar quem queira nos ouvir falar dos mortos. Até porque, nessa situação
específica, meu círculo mais próximo estava vivendo o luto também, cada um
tentando atravessar os tsunamis do jeito que deu. Talvez seja a hora de falar
da tristeza pra ela, finalmente, ir embora em paz.
Nessa temporada de fechamentos que começou ontem, eu espero
somente que a saudade venha cada vez mais parecida com um quadro de Monet, em
tons suaves, e menos como um grito do Munch. Que ela more aqui dentro pisando
suave, sem bater panelas de manhã cedo. E que eu possa falar dela com a leveza
que eu sinto a presença desses 3 comigo todos os dias.
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